Valete
No Meio das Labaredas
[Verso 1: Valete]
Eu sou o bófia que entra no ghetto com instinto assassino
Eu sou o ghetto sem futuro sem destino
Eu sou o teu pai a pontapear a tua mãe
Eu sou tua mãe a chorar e a dizer-te que 'tá tudo bem
Sou Tony Carreira cheio de sucesso e afeto
Sou o maior cantor do país a pedir esmola no metro
Eu sou o grande traficante de droga sem cadastro
Sou o pequeno traficante há 5 anos encarcerado
Sou o teu patrão num BM X3
Sou a tua cara quando vês a conta bancária a meio do mês
Eu sou a retórica destes políticos cheio de juras e ilusões
Sou a irrelevância do teu voto no dia das eleições
Eu sou tua avó na igreja a rezar por um mundo mais humano
Eu sou o padre a enrabar o teu irmão de dez anos
Sou filho de Salazar e de Antero de Quental
Uma nação duas caras, eu sou Portugal!

[Verso 2: Valete]
Que sa'foda o comunismo, mano eu amo as pessoas
A ideologia está só neste amor que me abençoa
Eu choro em cada fraqueza que te amaldiçoa
Eu vivo em cada sentimento que te povoa
Nunca viste um corpo subnutrido?
A cair no solo, desfortalecido, inerto e apodrecido?
Nunca viste uma mãe a vender o seu próprio filho?
A perder p'ra miséria e p'ra vida sem trilho?
Nunca viste uma criança no meio do fogo cruzado
Paralisado, com as almas opacas destes homens armados?
Nunca viste um homem no alto mar
Com uma canoa à procura da Europa e sem saber p'ra onde remar?
Nunca viste nada disso, tu não entendes a luta
Não entendes a necessidade de ter a alma incorrupta
Não entendes a mensagem que nos impede de viver sós
Nós somos os outros e os outros somos nós, mano
Vê tantos outros que precisam se nós
Hoje é por esses outros que eu ergo a minha voz
És a fauna, és a flora, és a aurora, és a história
És o rio, és o sol, és a nascente e a foz
Tudo és tu e tu és tudo, tu sem o tudo és dor, és luto
P'ra indiferença que propagas não tens álibi
Este mundo que acaba, acaba dentro de ti
[Refrão: Samora]
A florescer no meio das nuvens negras
Olha p'ra mim no meio das labaredas
Olha p'ra mim no meio das labaredas
A renascer aqui onde só há trevas
A florescer no meio das nuvens negras

Olha p'ra mim no meio das labaredas
A renascer aqui onde só há trevas
A florescer no meio das nuvens negras
Olha p'ra mim no meio das labaredas